MUROS EM FAVELAS DO RJ II

Sobre a construção de muros em favelas do Rio de Janeiro é apropriado lembrar que, seja o discurso contra ou a favor o importante é não esquecermos que vivemos um momento de globalização no qual a diluição das fronteiras econômicas e sociais é um fato. Portanto, é no mínimo contraditório o projeto dos governos estadual e municipal de delimitar as favelas erguendo muros de separação. Parece-me que há certa obscenidade nisso, dado o caráter dissimulado do ato. Erguer muros como estes não é função do Estado. O que os governantes, juntos nas três esferas do poder, deveriam fazer e não fizeram seria impedir o crescimento e, mesmo, o surgimento das favelas, com projetos de habitação popular, geração de emprego e renda e fixação do homem no seu lugar de origem, dando-lhe condições de vida digna em sua própria terra, em sua cidade, em seu estado. Tivessem tomado tais medidas não haveria favelas e sim bairros populares. Não haveria moradores de rua nas grandes metrópoles brasileiras. Mas, tudo o que o poder público tem feito ao longo dos anos é suavizar a aparência da favela mudando sua denominação como aconteceu em um passado recente quando favela virou “complexo social”, agora transformado em “comunidade”. Algumas vezes, os moradores dessas áreas são alvo de programas sociais que servem mais para fins eleitoreiros do que para minimizar o sofrimento das pessoas alvos dessas benesses.
Não importa o nome com que designam essas comunidades: a miséria, o descaso, a violência, a ausência do poder público continuam...
Parece tarde para regressar. As favelas estão aí gritando a plenos pulmões um pedido de socorro que contagia toda a sociedade do Rio de Janeiro. Esta mesma sociedade que parecia não perceber suas mazelas. Esta mesma sociedade que cercou-se de segurança armada, de cercas eletrificadas, de muros altos, de câmeras de vigilância, de carros blindados para manter um distanciamento de tais “problemas”. Isso mesmo: “problema”. Mas um problema que lhe soava alheio, que não lhe dizia respeito, que não lhe atingia diretamente.
Um dia, os problemas desceram o morro e começaram a alvejar as “pessoas do asfalto” assustando, matando, demonstrando a vulnerabilidade do cidadão comum ante a organização e o poder dos delinqüentes que, para fugir ao braço da lei se homiziam no interior das favelas. Mas, o pior de tudo é a constatação da impossibilidade do Estado em enfrentar, combater e eliminar tais ameaças. Isso porque o poder público está minado pela corrupção e pelo crime organizado que sorrateiramente infiltrou-se na vida pública amparado pelo caráter benevolente das leis brasileiras. E, como solucionar tantos problemas? Construindo muros? Removendo as favelas? É claro que não.
Entretanto, se o Estado oferecer condições permanentes, sem paternalismo, muitas das pessoas que hoje sofrem nas favelas retornarão de bom grado as suas origens. Ou, buscarão cidades menores com melhor qualidade de vida, como está ocorrendo na região dos lagos, RJ que tem recebido milhares de pessoas fugitivas da violência do Grande Rio.
Para tal seria preciso um “esforço de guerra” dos três poderes. Além disso, a abertura de ruas nas favelas, a instalação de quartéis da polícia ou delegacias no alto dos morros e a construção de habitações verticais redimensionando e organizando o espaço urbano permitiriam, ao poder público, a retomada do controle dessas áreas e a inclusão social de todas as pessoas da “comunidade” sem necessidade de muros, fossos ou quaisquer outros mecanismos de separação.
Ou seja, não é impossível. É trabalhoso. E trabalho não costuma ser a “praia” de quem exerce cargo público. É mais cômodo e atual fazer discursos ecológicos de dentro dos gabinetes ou na rua, cercado por seguranças armados, do que tomar decisões que não darão frutos imediatos.
É por isso que a planta das favelas continuará sendo: aglomerados de construções irregulares cortados por vielas estreitas, tortuosas, escuras e perigosas. E seus moradores continuarão sujeitos a toda sorte de humilhação sem que o Estado lhes garanta um mínimo de dignidade; porque também ele está frágil ante o poder dos traficantes, e a única parte dele que entra na favela é a polícia, armada com fuzis, protegida por coletes à prova de balas e, às vezes, dentro de uma instituição propriamente chamada “caveirão”.
Em suma: o grande mal não é a construção de um muro e sim o significado desse ato na cidadania de todos nós. Onde fica o direito de ir e vir, e o: “não haverá discriminação de nenhuma natureza”, expressos na constituição brasileira? Parece-me que o poder público é tendencioso e elitista quando usa seu poder para construir um “muro social” e não exterioriza esse mesmo poder na defesa e guarda da vida dos seus cidadãos que lutam estoicamente pela sobrevivência transitando em meio ás violências do pode legal, omisso e do poder ilegal, tirano.

1 comentários:

  1. Fala, Carlos!
    Arrumei um tempinho pra dar uma olhada no seu blog. Estão bacanas suas considerações.
    Eu estava escrevendo outro comentário antes desse, mas deu pau no site e apagou tudo.
    Outra hora passo pra escrever. Abçs.
    Arnaldo.

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