Nestes últimos dias assistimos atônitos a mais um embate entre as
forças do poder constituído e parcela da população. Desta vez foram os
professores da rede pública do RJ que, em greve, fizeram manifestações diárias
diante das casas legislativas do Estado e pelas ruas da cidade em protesto
contra os baixos salários e a falta de um plano de cargo que lhes seja
favorável. A Câmara municipal do Rio votou e
aprovou consensualmente e em tempo recorde um plano de carreira oriundo da prefeitura, o que
desagradou aos professores por não levar em conta suas reivindicações e pela
falta de representantes dos docentes na casa legislativa durante a votação.
Enquanto no plenário do
legislativo municipal os vereadores se esforçavam para concluir a votação, do
lado de fora os manifestantes entravam em choque com a polícia militar que,
mais uma vez foi usada como instrumento de repressão a uma manifestação
legítima. “Tudo democraticamente”! As bombas de gás, os morteiros, os
cassetetes, a truculência fazem parte da ação “legítima” do Estado contra o
cidadão. Não podemos esquecer os infiltrados que são usados para promoverem
badernas e provocarem a reação da polícia. O que "justificaria" a violência
policial.
O que precisamos nos perguntar é:
por quê os professores chegaram a esse ponto?
A resposta pode ser: por causa
dos baixos salários pagos a profissionais que precisam dedicar-se integralmente
a sua formação e tarefa de ensinar.
Também pode ser: por causa do stress que acomete todos esses
profissionais por causa das condições de trabalho adversas, principalmente os
que atuam nas periferias dos grandes centros e áreas de risco. Ainda pode ser
por causa da desvalorização do ensino de modo geral agravada pelo descaso das
autoridades constituídas para com o aspecto físico das escolas.
Todos esses fatores juntos
desembocaram na atual greve dos profissionais de educação que vêem, ano após
ano, suas expectativas serem jogadas na lixeira comum da hipocrisia
governamental que, por um lado exige deles formação continuada e dedicação
exclusiva; por outro lado fecha os olhos as suas necessidades básicas como
segurança, habitação, saúde, em casa e no local de trabalho.
Sem professores não há educação.
Sem educação não se constrói uma nação soberana. É o professor quem transmite a
cultura, a história, o conhecimento tecnológico às gerações. Sem isso não se
geram cidadãos, não se forjam homens conscientes de seus deveres e direitos, não
se moldam caráter, não se ensina patriotismo e os conceitos de sociedade. Os
professores, junto com os pais, com as famílias são vitais para a construção de
qualquer nação. Então, porque são menosprezados, desvalorizados e submetidos a
situações até vexatórias, algumas vezes?
Para essa pergunta a resposta é
mais simples: quem governa prefere que o povo seja analfabeto, sem cultura;
pois quem não sabe pensar por si só aceita qualquer coisa que lhe ofereçam, crê
em qualquer coisa que lhe digam.
Esse é o objetivo dos governos que
temos tido: tirar de nós toda e qualquer condição de reflexão para nos
impossibilitar de reagir contra ele.
O Estado brasileiro destruiu a
educação pública para que ficássemos à mercê de sua vontade. Também destruiu a
saúde pública para que não tivéssemos força nem condições de protestar. Vivemos
ocupados demais trabalhando para comer e pagar as contas. Não temos tempo para
manifestações públicas. Não é mesmo? E quando vemos esses
movimentos sociais, pensamos que “isso é coisa de desocupados!”
Isso é o que o Estado quer que
pensemos! Por esse motivo é que antes que o protesto dos professores ganhasse o
mundo através das manchetes dos jornais, o governo providenciou a aprovação do
plano de cargo dos professores. Assim, passa para a população a idéia de que
está buscando melhorar a vida de uma classe de profissionais que só quer
provocar tumulto e afrontar o governo, prejudicando os alunos sem se importar
com o impacto que causa a sociedade. O mesmo se dá com o programa “mais médicos”. O governo contrata médicos estrangeiros e
coloca-os para trabalhar em lugares onde não há saneamento básico, transporte
público eficiente, postos de saúde, hospitais, vacinas, gaze, esparadrapos,
ambulâncias, salas de cirurgia, linhas para sutura, anestesistas, profissionais
especializados como ortopedistas, cardiologistas e, o mais grave de tudo:
emprego digno para a população. Então, vai para a mídia e diz com palavras
bonitas e a mesma hipocrisia que está oferecendo atendimento médico a todos os
brasileiros órfãos de saúde. Ora! Aqui nos grandes centros os hospitais estão
caindo aos pedaços, os profissionais de saúde estão sobrecarregados, muitas
vezes falta até maca para transportar os doentes. Como será que é no interior
onde as TV`s não tem interesse em mostrar? Não faltam médicos. Falta tudo na
saúde. E tem mais: se o governo oferecesse esse mesmo salário aos médicos
brasileiros e condições dignas de trabalho todos nós teríamos atendimento de
qualidade. Mas não é isso o que
acontece. O Estado trabalha para que os planos de saúde prosperem e transfere a
responsabilidade de cuidar da saúde para o próprio cidadão que tem que pagar
mensalidades cada vez mais caras aos donos da “saúde”. Está na constituição:
saúde é dever do estado, como segurança e educação.
Com propaganda direcionada o
governo faz dos professores, assim como dos médicos, vilões diante de toda uma
população necessitada de cuidados e atenção eximindo-se de qualquer
responsabilidade ou culpa pelos desacertos havidos antes, e futuros. O fracasso
das ações não será imputado ao governo e sim aos profissionais envolvidos. Com
isso estão garantidos palanques e votos nas próximas eleições. Isso é tudo o
que importa para eles.
O círculo continuará fechado e em
movimento. O povo continuará sem saúde e sem educação, sem nada. Portanto, sem
condições de refletir para questionar as ações do governo. Este continuará
produzindo mais desigualdades e mais sofrimento indiscriminadamente. E, sempre
que necessário, sacará da cartola outra ação ou programa genial para usar como
sino diante do gado, movendo a massa em direção aos seus interesses eleitorais
e econômicos.
Precisamos aprender a pensar, a
refletir. Precisamos nos educar para escolher melhor nossos líderes, nossos
legisladores, nossos administradores. Sem educação não há liberdade. Sem
liberdade não há democracia.
Já é hora de acordarmos para a
realidade. Somos um gigante de duzentos milhões de pessoas. Mas, se nem nós
mesmos nos respeitamos como seremos respeitados pelas outras nações? É por isso
que todos os povos riem de nós, nos desprezam. Falta-nos a dignidade de cidadãos,
o sentimento de patriotismos que um dia aqui existiu. Falta-nos o senso de
sociedade, de coletividade, de nossa importância como nação. Não somos
indivíduos isolados. Todos nós somos dependentes uns dos outros. Não importa a
cor da pele, o credo, a idade, somos todos brasileiros e precisamos aprender o
valor do respeito próprio e mútuo. Precisamos abrir os olhos para a realidade e
aprender a exigir respeito! Já basta de mentiras!